Um dos temas jurídicos mais frequentes é a responsabilidade civil, dado que o exercício de qualquer atividade pode redundar no comprometimento dos agentes envolvidos. Quando o assunto é aplicado ao meio condominial, tende a ter maior amplitude ainda, pois a vida em comunidade é um complexo de relações sociais e jurídicas que podem, em algum momento, culminar no pagamento de indenizações.
E, justamente por ser usual, a responsabilização civil por furtos ou danos causados aos veículos nas áreas comuns é fonte de medo e inquietações, principalmente por parte das pessoas incumbidas de administrar o condomínio.
Para tornar a abordagem mais clara, vamos narrar precisamente como costuma surgir tal ocorrência no cotidiano do condomínio. Um certo dia a administração do condomínio é procurada por um condômino, que exige o pronto ressarcimento de danos causados ao seu veículo estacionado na área comum. A narrativa dá a certeza do dano, afirma sua consumação nos limites do condomínio, mas informa ser desconhecida a identidade do ofensor, de modo a justificar o envolvimento do condomínio. Para viabilizar o ressarcimento, o condômino apresenta orçamento dos serviços reparatórios. Não raro o contato se dá em tom de urgência e ameaça. Caso o pedido não seja aceito desde logo, o suposto vitimado promoverá ação judicial contra o condomínio.
O primeiro dado sensível que cabe ser dito é que, em regra, o condomínio não responde pelos furtos, danos ou roubos ocorridos nas suas áreas comuns.
Em outras palavras, o condomínio edilício só responde de modo excepcional, desde que comprovadas algumas circunstâncias peculiares.
Para o fim de se saber se, excepcionalmente, haveria a responsabilidade civil, cada caso merece ser estudado com a aplicação sucessiva dos parâmetros seguintes:
a- comprovação da existência de nexo causal: veracidade de que o prejuízo decorrente de furto, dano ou roubo existe e se deu nos limites do condomínio;
b- inexistência de causa excludente de responsabilidade: legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal, exercício regular de um direito reconhecido, estado de necessidade, caso fortuito ou força maior e culpa exclusiva do suposto vitimado;
c- verificação se o dano ocorreu por dolo ou culpa do representante ou prepostos do condomínio (empregados). Se positiva a constatação, o condomínio responderá (art. 932, III, do Código Civil);
d- análise do que diz a Convenção do Condomínio a respeito do assunto, tanto no aspecto positivo, prevendo expressamente a responsabilização do condomínio, ou no aspecto negativo, contendo cláusula de não indenizar. Tal espécie de cláusula, cuja existência é muito comum, evidencia a regra de que o condomínio não responde pelos furtos, danos ou roubos ocorridos nos limites, sendo acatada e prestigiada pela jurisprudência, como adiante será visto;
e- constatação do nível, proporção e qualidade da segurança existente no condomínio. Quanto maior e mais especializada for a segurança fornecida, maiores serão as despesas arcadas pelos condôminos e, consequentemente, maior será o dever de guarda assumido pelo condomínio. Se o condomínio dispõe de uma segurança qualificada como padrão (normal), então não haverá responsabilidade, devendo cada condômino vitimado arcar com o preço do seu prejuízo. Do contrário, isto é, se houver a supervigilância, haverá dever de guarda e, portanto, responsabilidade.
A orientação acima é extraída da interpretação do Código Civil que é feita dia a dia por nossos tribunais. Ao tema é inaplicável o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), já que a relação condomínio-condômino não caracteriza relação de consumo. Os julgados abaixo, todos recentes, exemplificam o quanto foi dito:
Ementa: CONDOMÍNIO EDILÍCIO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. Furto em condomínio edilício. Necessidade de previsão expressa de responsabilidade na Convenção Condominial. Entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça. Ausência de comprovação dos fatos constitutivos do direito alegado. Manutenção da r. sentença. RECURSO DO AUTOR NÃO PROVIDO (TJSP – Apelação 1022352-33.2017.8.26.0100; Relator (a): Berenice Marcondes Cesar; Órgão Julgador: 28ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 45ª Vara Cível; Data do Julgamento: 17/04/2018; Data de Registro: 19/04/2018).
Ementa: Indenização por dano material não devida – Condomínio não se responsabiliza por móveis roubados ou furtados em sua dependência – Ausência de cláusula que responsabiliza condomínio por veículos roubados/furtados, bem como de segurança especializada – Recurso não provido (TJSP – Apelação 0027470-16.2012.8.26.0477; Relator (a): Mônica de Carvalho; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro de Praia Grande – 3ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 22/06/2018; Data de Registro: 22/06/2018).
Concluindo, os parâmetros acima relacionados devem ser sucessivamente analisados para o fim de se concluir se é caso ou não de responsabilização do condomínio e de modo a se evitar o pagamento de valores indevidos.
Dr. João Paulo Rossi Paschoal: Advogado, mestre em direito pela PUC/SP, especialista em direito civil e direito Imobiliário, docente da UNISECOVI-SP e da UNINOVE, Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP e da Comissão de Direito Imobiliário da Subseção de Pinheiros da OAB/SP. joaopaulorp@gmail.com