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Os condomínios irregulares e os de fato e a inadimplência

Os condomínios irregulares e os de fato e a inadimplência

A inadimplência é um assunto que costuma ser um grande desafio aos síndicos de condomínios com o perfil de HIS – Habitações de Interesse Social.
São tidos como HIS os condomínios nascidos usualmente da atuação de empresas públicas (COHAB, CDHU), ou impulsionadas por verbas públicas (programa “Minha Casa, Minha Vida”), destinados ao atendimento de parcela da população sem acesso econômico aos produtos usualmente disponibilizados pelo mercado imobiliário.

A bem dizer, se a inadimplência é um problema que, tradicionalmente, afeta os condomínios brasileiro em geral, nos condomínios HIS o assunto ganha contornos dramáticos, eis que, não raro, tais empreendimentos apresentam documentação deficiente, sendo exemplos certos condomínios sem o CNPJ, ou mesmo, sem a Convenção.

Em tais casos, a ideia de que o próprio condomínio carece de plena regularização faz transparecer para muitos condôminos e ocupantes que o pagamento das contribuições mensais deixa de ter conteúdo obrigatório, servindo tal quadro como um incentivo ao não pagamento.

E, a reboque de tão dura realidade, surgem questionamentos sobre a possibilidade de protesto extrajudicial de tais verbas, bem como da sua cobrança ou execução judicial.

A possibilidade do condomínio de fato (o ainda não instituído), ou mesmo o condomínio irregular (instituído, mas sem Convenção) cobrar em juízo (ação de cobrança) suas quotas condominiais é uma questão antiga, bastante conhecida pelo nosso Poder Judiciário, o qual, como regra, dá ganho de causa ao credor (condomínio), desde que comprovada a realidade dos serviços prestados pela administração, que ensejaram as despesas então cobradas.

Dito de outro modo, sendo uma ocorrência antiga que se repete em inúmeros condomínios, a jurisprudência revela um posicionamento firme no sentido da possibilidade de que o condomínio, mesmo sendo irregular ou de fato, possa recuperar seus créditos, sendo a via própria para tanto a ação de cobrança, uma ação de conhecimento que visa a formação de um título executivo judicial.

Portanto, por não dispor de um crédito certo, líquido e exigível nos moldes exigidos no art. 784, X, do Código de Processo Civil, o condomínio irregular ou de fato não pode tomar a iniciativa de protestar ou executar os devedores, sendo viável o acionamento pela tradicional cobrança.

Os julgados abaixo, oriundos do Tribunal de Justiça de São Paulo, ilustram o quanto acima foi dito:

Ementa: Apelação. Cobrança de despesas condominiais. Condomínio de fato. Legitimidade. Regularidade da cobrança. Presença dos documentos indispensáveis. Ônus da parte requerida de demonstrar a quitação dos valores devidos. Sentença de procedência mantida. Administração do Condomínio a ser discutida em vias próprias. Recurso improvido (TJSP – Apelação 4005159-25.2013.8.26.0348; Relator (a): Bonilha Filho; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro de Mauá – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 14/09/2017; Data de Registro: 15/09/2017).

Ementa: DESPESAS CONDOMINIAIS – COBRANÇA – PROCEDÊNCIA DA AÇÃO – Ilegitimidade ativa e passiva afastada – O condomínio de fato detém legitimidade para ajuizamento da causa – Unidade condominial devedora objeto instrumento de venda de imóvel a prazo, figurando a ré como promissária compradora – Inépcia da inicial e falta de interesse processual não verificadas – Ação necessária para cobrança do valor inadimplido – Exordial confeccionada e instruída em termos – Cerceamento de defesa – inocorrência – Documentos pleiteados prescindíveis ao caso – Ausente prova de pagamento das taxas condominiais cobradas – Hipótese em que a ré não se desincumbiu de demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor – Artigo 373, II do CPC – Obrigação positiva e líquida – Incidência da correção monetária e juros de mora a partir do vencimento de cada prestação – Sentença mantida – Recurso desprovido, rejeitadas as preliminares (TJSP – Apelação 1000192-67.2016.8.26.0223; Relator (a): Claudio Hamilton; Órgão Julgador: 25ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guarujá – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/06/2017; Data de Registro: 23/06/2017).

Ementa: APELAÇÃO – DESPESAS CONDOMINIAIS – COBRANÇA – Ilegitimidade ativa – Inocorrência – Documentos acostados se mostram aptos a demonstrar a existência do condomínio ainda que de fato e a simples falta de registro não afasta a possibilidade deste realizar a respectiva cobrança das despesas condominiais devidas – Ilegitimidade passiva – Havendo compromisso de compra e venda não levado a registro, a responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto – Recurso Especial nº 1.345.331 – RS – No caso não restou demonstrada ciência inequívoca do condomínio sobre a transação de aquisição da unidade – Obrigação propter rem, obrigação solidária entre proprietário, possuidor e promissário comprador – Procedência da cobrança – Inadimplência incontroversa – Ausência de fatos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito do autor – Possível penhora em fase de execução deverá recair exclusivamente sobre o imóvel gerador dos débitos – Recurso provido (TJSP – Apelação 0009284-91.2012.8.26.0008; Relator (a): Mario Chiuvite Junior; Órgão Julgador: 19ª Câmara Extraordinária de Direito Privado; Foro Regional VIII – Tatuapé – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/08/2015; Data de Registro: 12/08/2015).

Ementa: Condomínio – Ação de cobrança de despesas condominiais – Cerceamento de defesa – Inocorrência – Provas irrelevantes – Falta de inscrição do condomínio no CNPJ – Irregularidade que não infirma a cobrança – Impugnação genérica da planilha de débito Impossibilidade – Inteligência do art. 333, II, do CPC – Inconformismo manifestamente protelatório – Recurso não provido com imposição de penalidade por litigância de má- 1. Não há cerceamento de defesa quando as provas pretendidas são irrelevantes para a solução do litígio, em vista dos documentos já constantes dos autos. 2. A falta de registro do condomínio no CNPJ não impede a cobrança judicial das despesas condominiais. A existência reconhecida do condomínio, ainda que apenas de fato, gera a obrigação dos condôminos de contribuir para a sua manutenção. 3. A insurgência do condômino quanto aos valores dos rateios deve ser manifestada pelos meios adequados, e não em sede de cobrança, especialmente quando deduzida a impugnação em termos formais e genéricos. Em princípio, a planilha discriminada de débito e a ata da última assembleia geral bastam para instruirá inicial. 4. Litiga de má-fé a parte que deduz defesa e interpõe recurso sem o menor laivo de juridicidade e em que, sem negar o débito objeto da cobrança, intenta tergiversar, questionando aspectos formais, secundários, irrelevantes e impertinentes. (TJSP – Apelação 9173649-38.2009.8.26.0000; Relator (a): Reinaldo Caldas; Órgão Julgador: 29ª Câmara de Direito Privado; Foro de São Caetano do Sul – 2ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 28/07/2010; Data de Registro: 03/08/2010).

Como conclusão, exaurida a tentativa amigável e extrajudicial para recuperação dos créditos condominiais, a ação de cobrança é medida possível e recomendada, eis que, sem a arrecadação de tais valores, a vida em comum tende a degradar-se a tal ponto que os benefícios e serviços mais elementares são inviabilizados, bem como esgarçada a coesão social.

Autor: Dr João Paulo Rossi Paschoal 

Advogado, mestre em direito pela PUC/SP, especialista em direito civil e direito Imobiliário, docente da UNISECOVI-SP e da UNINOVE, Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP e da Comissão de Direito Imobiliário da Subseção de Pinheiros da OAB/SP. joaopaulorp@gmail.com

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Os aposentados podem escolher a data para pagamento das contribuições condominiais?

Os aposentados podem escolher a data para o pagamento das contribuições condominiais? 

É sabido que a obrigação de pagar o condomínio é espécie de obrigação de “trato sucessivo”, pois se renova mensalmente, tendo data certa de vencimento, por todos os condôminos e ocupantes conhecida.

Neste sentido há julgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

“É mais que evidente que o pagamento de despesas condominiais configura prestação continuada ou prestação de trato sucessivo. Assim, dúvida não existe que a sentença poderia, como quer o autor, condenar o requerido a pagar prestações vencidas no curso do processo, enquanto durar a obrigação” (TJSP, 36.ª Câm. Dir. Priv., rel. Des. Romeu Ricupero, Ap 0136410-13.2010.8.26.0100-SP, j. 20.1.2011, v.u.).

Não raro tal data consta por expresso da Convenção do Condomínio ou de ata de assembleia geral.

Na falta de disposição específica e expressa sobre o do assunto, bastará a prática consolidada, conhecida e aceita, é a famosa “praxe” por todos adotada (usos e costumes), que também tem força obrigatória. A Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei nº 4.657/42) serve de base para tal afirmação:

Decreto-lei nº 4.657/42

Art. 4° Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
Na mesma linha, vale lembrar que o Código Civil em vigor prestigiou a boa-fé, a probidade e a coerência nos atos praticados, não sendo diferente sua recomendação sobre o assunto em estudo:

Código Civil

Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

A data de vencimento, por todos conhecida e praticada, deve ser respeitada fielmente, sob pena da consumação da inadimplência e de suas repercussões.

Vale o alerta de que a modificação da data de vencimento depende de decisão de assembleia geral de condôminos, escorada no voto favorável de 2/3 (dois terços) dos condôminos.

Costuma existir confusão sobre o assunto dado o teor da Lei Federal n° 9.791/99, que alterou a Lei n° 8.987/95 (Lei das Concessões), e dispôs sobre “a obrigatoriedade de as concessionárias de serviços públicos estabelecerem ao consumidor e ao usuário datas opcionais para o vencimento de seus débitos”. Tal lei é aplicável, por óbvio, apenas para contas oriundas das empresas concessionárias, que não abarca os condomínios edilícios, entidades de natureza claramente privada.

De conseguinte, lei alguma permite que os condôminos ou ocupantes aposentados efetuem o pagamento do rateio condominial em data diferenciada.

Autor: Dr. João Paulo Rossi Paschoal – Advogado, mestre em direito pela PUC/SP, especialista em direito civil e direito Imobiliário, docente da UNISECOVI-SP e da UNINOVE, Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP e da Comissão de Direito Imobiliário da Subseção de Pinheiros da OAB/SP. joaopaulorp@gmail.com

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Destituição de síndico do condomínio

É possível destituir o síndico de um condomínio? Saiba quais motivos podem dar causa e como deve ser o procedimento assistindo a essa entrevista.

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Há, apenas, um tipo de condomínio?

Há, apenas, um tipo de condomínio?

O termo “condomínio” traduz a ideia de propriedade comunitária. Segundo Plácido e Silva, pode ser definido como a “palavra formada da preposição com e do substantivo domínio, do latim dominium (direito de propriedade), assinala a circunstância de ser a propriedade pertencente a mais de uma pessoa”. SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 31º ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 526.

Se a sua raiz diz respeito a propriedade em comum, sua aplicação prática em nosso direito deu origem a diferentes institutos jurídicos, com concepções e finalidades diversas, bem com base normativa própria.

Assim, quando se usa a palavra “condomínio” há que se ter o cuidado que estamos diante de um vocábulo que se presta a representar variadas figuras jurídicas.

Os autores identificam duas fontes que alimentaram a atual ideia de condomínio. A primeira foi o direito romano, que admitia o condomínio como uma exceção à regra da propriedade exclusiva de uma só pessoa. Os romanos concebiam o condomínio como uma só propriedade indivisa, com vários titulares detentores de partes ideais. A segunda fonte é teuto-feudal, em que o condomínio não estava associado à ideia de parte ideal, mas sim a uma coletividade de condôminos (propriedade de uso comum ou comunhão de mão comum), muito semelhante às sociedades atuais.

No nosso direito é prevalente a influência do direito romano, concebendo-se o condomínio como propriedade comum composta por partes ideais, sem correlação com sociedade ou personificação jurídica, frente a falta da affectio societatis, que pode ser traduzida como o ânimo de associação existente entre pessoas que decidem empreender em sociedade, isto é, decidem por criar uma pessoa jurídica para o alcance dos seus propósitos negociais.

No Código Civil é possível notar diferentes tipos de condomínio: os arts. 1.314 a 1.330 do tratam do condomínio geral ou tradicional e os arts. 1.331 a 1.358 regem o condomínio edilício, sendo o art. 1.348-A, um recente acréscimo legislativo, específico sobre o condomínio de lotes, figura que também encontra sustentação nos arts. 2º, § 7º, e 4º, § 4º, ambos da Lei nº 6.766/79 (Lei do Parcelamento do Solo Urbano).

O condomínio geral, por sua vez, é dividido em voluntário (arts. 1.314 a 1.326) e necessário (arts. 1.327 a 1.330). A figura do compáscuo, prevista no art. 646 do Código Civil de 1916, não foi repetida no diploma atualmente em vigor.

Sob a rubrica “condomínio voluntário” albergam-se situações originadas de ajuste contratual (condomínio voluntário propriamente) e da sucessão hereditária.

Por sua vez, o condomínio necessário ou forçado reúne as situações em que o condomínio é criado como decorrência do direito de vizinhança, sem a vontade dos condôminos envolvidos. Trata-se do condomínio por meação de paredes, cercas, muros e valas.

Além do condomínio geral, o Código Civil traz o condomínio edilício que “… é o direito real de uso, gozo e disposição jurídica sobre uma coisa própria consistente em uma unidade funcional de um imóvel edificado, que está integrado por uma parte privativa consistente em uma fração do edifício e por uma cota parte indivisa sobre o terreno e sobre todas as partes ou coisas comuns do edifício”. GATTI, Edmundo. Teoria general de los derechos reales. 3ª ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1984, p. 140-141.

Além da classificação condominial acima apresentada, oriunda do Código Civil, o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/01) veicula o “condomínio urbano especial” no seu art. 10 e a “Lei da Regularização Fundiária Urbana – REURB” (Lei nº 13.465/17) traz a figura do “condomínio urbano simples” nos arts. 61 a 63.

Ainda que não sejam figuras propriamente condominiais, o direito real de laje (arts. 1.225, XIII e 1.510-A a 1.510-E do Código Civil) e o loteamento de acesso controlado (art. 2º, § 8º, da Lei nº 6.766/79 e arts. 248, § 4º, e 252, parágrafo único, ambos do Código de Processo Civil) acabam por sofrer influência das práticas aplicáveis ao condomínio edilício.

Por falta de disposições legais mais específicas e precisas, algumas hipóteses peculiares, ensejadas pela modernização da sociedade ou do aumento de sua complexidade, são levadas a adotar os arts. 1.331 a 1.358 do Código Civil como seu regime jurídico ou mesmo como inspiração para elaboração de seus atos institutivos, bem como para a sua prática cotidiana. Neste sentido foi elaborado o Enunciado n° 89 da Jornada de Direito Civil:

Enunciado n° 89 – Art. 1.331: O disposto nos arts. 1.331 a 1.358 do novo Código Civil aplica-se, no que couber, aos condomínios assemelhados, tais como loteamentos fechados, multipropriedade imobiliária e clubes de campo.
Portanto, de modo breve, são as figuras acima catalogadas as hipóteses que ilustram a flexibilidade do instituto do condomínio, bem como a sua importância nos âmbitos jurídico, econômico e social.

Autor: Dr. João Paulo Rossi Paschoal – Advogado, mestre em direito pela PUC/SP, especialista em direito civil e direito Imobiliário, docente da UNISECOVI-SP e da UNINOVE, Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP e da Comissão de Direito Imobiliário da Subseção de Pinheiros da OAB/SP. joaopaulorp@gmail.com

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O condômino pode instalar câmeras particulares na área comum?

O condômino pode instalar câmeras particulares na área comum?

O assunto “segurança patrimonial e pessoal” é um dos temas que mais chama a atenção de todos na atualidade, por motivos óbvios. Aliás, tal questão funciona como um forte apelo para que as pessoas optem por residir em condomínios edilícios ou loteamentos de acesso controlado, entidades que, pelo seu formato e porte, teriam maior possibilidade de fornecer um ambiente seguro, se comparadas com a propriedade individual e isolada.

É sabido que o delicado assunto segurança é mais um dos temas que fica ao crivo da vontade democrática dos condôminos sedimentada nas assembleias gerais. A ideia é simples: cabe aos próprios interessados (condôminos) o estudo, debate e aprovação do tipo e nível de segurança que se pretende implementar e ter, no interesse e benefício coletivo.

Contudo, apesar da realidade acima descrita, não raro surge o relato de que condôminos instalam clandestinamente câmeras particulares nas áreas comuns. Se diz “clandestinamente” pois a medida é adotada sem o consentimento dos seus pares e, tampouco, conhecimento, participação e controle da administração do condomínio. Sobre as áreas comuns diz o art. 1.331, § 2°, do Código Civil:

Código Civil

Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.
(…)

  • 2º O solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos.

Ademais, sabe-se que um dos direitos do condômino é “… usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores” (art. 1.335, II, do Código Civil).

No mesmo sentido, sendo o representante legal do condomínio, cabe ao síndico “… diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns...” (art. 1.348, V, Código Civil).

E, como arremate, a interpretação sistemática e teleológica dos arts. 1.331 a 1.358 do Código Civil indicam que inovações ou modificações nas áreas comuns demandam prévia ciência e autorização por parte da assembleia geral de condôminos, o que se conseguirá, dependendo da hipótese, por votação qualificada. Tanto mais quando o assunto envolve aparato que pode gravar áudio e imagens das pessoas, o que será tratado em artigo futuro.

Com efeito, sem a adoção das cautelas acima relacionadas exigidas pela lei, não pode o condômino instalar câmeras particulares nas áreas comuns. É patente a ilegalidade da instalação clandestina, mormente no que toca ao citado art. 1.335, II, do Código Civil. E são meios para o controle do problema em estudo:

– No âmbito do condomínio: aplicação da penalidade prevista na Convenção ou Regimento Interno (art. 1.336 do Código Civil), por meio de notificação, exigindo-se pronta retirada das instalações feitas;

– Acaso perdurem as instalações, no âmbito judicial: ação de obrigação de fazer (cominatória), visando a imediata retirada do aparato das áreas comuns, sob pena de cominação de multa diária pelo descumprimento, bem como indenização pelos danos materiais ou morais causados;

– Se o infrator for locatário o locador deverá ser cientificado de todo o ocorrido: haverá possibilidade de quebra do contrato de locação, sujeitando-o a uma ação de despejo (que deverá ser promovida pelo locador).

Por fim, a jurisprudência corrobora o quanto acima foi dito:

Ementa: APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER CUMULADA COM INEXIGIBILIDADE DE MULTA. CONDOMÍNIO. Ausência de cerceamento de defesa. Produção de prova oral que não alteraria o resultado do julgamento. Instalação de câmeras nas áreas comuns. Inadmissibilidade, diante da ausência de autorização. Art. 1.336, III, do CC. Art. 42, ‘p’, do Regulamento Interno do condomínio. Concessão da gratuidade de justiça que não impede a condenação em honorários de sucumbência, cuja exigibilidade fica suspensa nos termos do art. 98, §3, do CPC. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO (TJSP – Apelação 1001403-26.2014.8.26.0477; Relator (a): AZUMA NISHI; Órgão Julgador: 37ª Câmara Extraordinária de Direito Privado; Foro de Praia Grande – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 05/02/2018; Data de Registro: 05/02/2018).

Ementa: CONDOMÍNIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. Decreto de improcedência. Incontroversa a instalação de câmeras de segurança, pelo autor, em área comum do condomínio (hall) – Alegação de que é proprietário das quatro unidades do mesmo pavimento. Irrelevância. Circunstância que não autoriza apropriação de área comum que tem uso delimitado pela convenção condominial – Improcedência corretamente decretada … Precedentes. Sentença mantida. Recurso improvido (TJSP –  Apelação 1005937-77.2014.8.26.0100; Relator (a): Salles Rossi; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 43ª Vara Cível; Data do Julgamento: 14/04/2015; Data de Registro: 14/04/2015).

Ementa: Apelação. Condomínio. Obrigação de não fazer. Conexão não verificada. Instalação privada de câmeras de vigilância em área comum do condomínio. Interesse individual que não pode se sobrepor ao interesse da maioria. Condomínio que já conta com sistema de vigilância próprio e acesso aos demais condôminos. Sentença de improcedência mantida, inclusive a sucumbência. Preliminar afastada. Recurso não provido (TJSP –  Apelação 0184040-65.2010.8.26.0100; Relator (a): João Pazine Neto; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 05/11/2013; Data de Registro: 05/11/2013).

Autor: Dr. João Paulo Rossi Paschoal. Advogado, mestre em direito pela PUC/SP, especialista em direito civil e direito Imobiliário, docente da UNISECOVI-SP e da UNINOVE, Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP e da Comissão de Direito Imobiliário da Subseção de Pinheiros da OAB/SP. joaopaulorp@gmail.com 

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A responsabilidade civil decorrente da queda ou arremesso de coisas

A vida em condomínio, como uma moderna manifestação do direito de propriedade, exige atenção às peculiaridades que norteiam tal forma de uso do imóvel.

E um dos aspectos mais comuns é que grande parte dos condomínios edilícios se apresenta concebido no formato de edificações construídas por andares sobrepostos.

Que fique claro que o condomínio edilício pode se valer de outras roupagens construtivas para vir ao mundo, como são exemplos os condomínios de casas, de sobrados ou mesmo de lotes, como oportunizado pelo acréscimo do art. 1.358-A ao Código Civil, por força da Lei nº 13.465/17 (Lei da Reurb).

De todo modo, fato é a multiplicidade de condomínios edilícios situados em construção por andares faz com que os dois fenômenos (o construtivo e o jurídico) acabem tendo identidade segundo o senso comum.
E uma das peculiaridades que a vida em condomínio com tal perfil construtivo traz é a necessidade de observar um aspecto, que além de ser uma regra elementar de boa educação, é alvo também da regência legal, eis que seu descumprimento pode ter sérias consequências.

A tormentosa questão diz respeito à responsabilidade civil pela queda ou arremesso de coisas, conhecida desde eras primevas, e que deu origem a actio de effusis et dejectis, cujo sentido não necessita de tradução, dada a proximidade dos termos latinos com a nossa língua mãe. A mencionada ação tratava de tudo aquilo que era jogado (lançado) do alto de um edifício, diretamente na via pública, na Roma antiga.

Vale a lembrança que já em Roma se construía edificações por andares, com nichos e cômodos alugados, destinados a servir de habitação. Recebiam o nome de ínsulas (insulae em latim). Um exemplo ainda existente é a Insula dell’Ara Coeli (século II), originalmente disposta em cinco andares, situada na Via del Teatro di Marcello em Roma (Itália), no sopé do Monte Capitolino e próximo da basílica de Santa Maria in Aracoeli.

Infelizmente, dos tempos dos romanos para cá, ao que consta os bons modos não avançaram tanto assim, de forma que a ocorrência continua a se repetir e é regida atualmente pelo nosso Código Civil no art. 938:

Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.

Trata-se de uma das modalidades de responsabilidade pelo fato da coisa, que recai de modo objetivo sobre o dono do imóvel ou, ainda, sobre o seu possuidor direto.

De conseguinte, se de forma clara, comprovada e inequívoca, for possível a identificação da pessoa que arremessou o objeto, a este caberá a responsabilidade pelo ressarcimento de eventuais danos causados (materiais e/ou morais), seja de forma voluntária e espontânea, ou forçada, via ação judicial.

Porém, acaso seja impossível determinar com exatidão a identidade do agente arremessador, inevitavelmente restará à coletividade (o condomínio como um todo) responder pelos prejuízos causados. E desde que fundado na Convenção do Condomínio ou no Regimento Interno, será viável imputar a responsabilidade à parcela do condomínio que tenha a face voltada para o local dos fatos, isto é, as unidades das quais, presumivelmente, se pode lançar o objeto danoso. Variações de tal regra (ex: exclusão das unidades desocupadas ou que durante o dia permanecessem vazias, etc.) também podem constar da Convenção do Condomínio ou no Regimento Interno, o que deverá ser conferido casuisticamente.

Um julgado representativo do quanto acima foi dito é abaixo destacado, para melhor ilustrar a matéria tratada:

Ementa: CONDOMÍNIO. Queda de líquidos e objetos das unidades dos andares superiores, na sacada do apelante, cuja área é superior em relação aos demais. Quedas acidentais que, mais recentemente, pela natureza dos objetos lançados (fralda suja, lingerie com fezes e líquidos sujos), denotam a intenção de ofender e humilhar. Incidência do art. 938 do CC (effusis et dejectis). Responsabilidade objetiva do condomínio, diante da impossibilidade de identificar o autor das condutas. Dano moral configurado. Indenização fixada em R$ 20.000,00 que é razoável e suficiente à reparação pretendida. Rateio do pagamento que deverá ser objeto de deliberação interna do condomínio, não sendo o caso de se definir, neste momento, as unidades responsáveis pelo pagamento, sob pena de ofensa ao devido processo legal e à ampla defesa. Obrigação de fechamento da sacada a expensas do condomínio que não se constata. Ausência de previsão legal ou no estatuto condominial. Medida que, ademais, implicará em alteração da fachada do prédio, além do aumento da área privativa do apelante, o que depende de prévia deliberação em assembleia, por quórum qualificado. Eventual intenção do síndico e do zelador em realizar a obra que não é vinculativa. Sentença mantida. Recursos desprovidos (TJSP – Apelação 4000628-58.2013.8.26.0003; Relator (a): Teixeira Leite; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional III – Jabaquara – 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/04/2015; Data de Registro: 06/05/2015).

Dr. João Paulo Rossi Paschoal: Advogado, mestre em direito pela PUC/SP, especialista em direito civil e direito Imobiliário, docente da UNISECOVI-SP e da UNINOVE, Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP e da Comissão de Direito Imobiliário da Subseção de Pinheiros da OAB/SP. joaopaulorp@gmail.com   

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O salário-moradia no condomínio 

O empregado que resida no condomínio em que trabalha deve receber, segundo a convenção coletiva de trabalho da categoria, 33 % (trinta e três por cento) de seu salário nominal a título de Salário-Habitação. 

Esse direito não é restrito ao zelador. Empregados que ocupem outros cargos também podem residir no edifício em que trabalham, até mesmo sendo proprietários de unidades autônomas e igualmente farão jus ao salário-habitação, pois, a cláusula convencional onde ele é previsto faz referência de forma genérica aos seus beneficiários, não mencionando especificamente o zelador. 

Uma dúvida surge na hora do pagamento de horas extras, devido o salário-habitação ser pago e descontado na mesma proporção, sendo, no entanto, somado ao salário do empregado para efeito de recolhimento das contribuições previdenciárias, FGTS, PIS e Imposto de Renda. Esta é a vantagem auferida pelo empregado: ter seu recolhimento de encargos aumentado em virtude desse componente da convenção coletiva da categoria. 

Assim, o fato do salário-habitação não ir para o “bolso” do empregado todos os meses, induz algumas pessoas a pensarem que ele não integra o cálculo das horas extras. 

Todavia, atualmente as convenções coletivas contêm um parágrafo terceiro, que foi acrescido à cláusula pertinente para esclarecer tal questão, dispondo da seguinte forma sobre a incidência do salário-habitação nas horas extras: “O salário nominal mais o salário habitação servirão de base para o recolhimento das verbas previdenciárias, fundiárias, PIS e Imposto de Renda, bem como para o pagamento das horas extras mensais, folgas e feriados trabalhados.” 

Referida cláusula também dispõe que seu pagamento no aviso-prévio indenizado e nas férias indenizadas não será efetuado até que o empregado desocupe a unidade que lhe foi cedida no condomínio em virtude do contrato. O texto do parágrafo segundo da cláusula em apreço é o seguinte: 

“Parágrafo Segundo — O desconto previsto no parágrafo anterior não será efetuado quando do pagamento de férias indenizadas, 13º salário e no aviso-prévio quando indenizado sendo que, em relação ao aviso-prévio Indenizado e às férias indenizadas, o empregado não fará jus ao acréscimo até que desocupe o imóvel. Nesse caso, o empregador deverá pagar ao empregado a verba correspondente a esse acréscimo, no máximo, em 10 (dez) dias contados da data da entrega das chaves do imóvel.” 

Portanto, no pagamento do décimo terceiro salário o Salário-Habitação permanecerá, será pago, sem o respectivo desconto, bem como, em caso de rescisão contratual, nas férias indenizadas e no aviso-prévio indenizado, mas, o percentual de 33% (trinta e três por cento) do salário nominal incidente nessas duas verbas, ficará retido (somente o percentual) até que o empregado venha a desocupar o imóvel. A partir da desocupação terá início o prazo de 10 (dez) dias para o condomínio lhe pagar essas diferenças. 

Dr. Carlos Alexandre Cabral: Advogado, Presidente da Comissão de Direito e Processo do Trabalho da OAB – 100ª Subseção – Ipiranga. Autor do “Manual de Direito do Trabalho para Condomínios” – 3ª ed. São Paulo: Editora LTr, 2018. E-mail:lexndr9@gmail.com

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Por que a inadimplência é um grande problema para os condomínios?

A escolha da vida em condomínio é a opção pela convivência em comunidade. Uma comunidade com farta regulamentação legal (Código Civil, Convenção de Condomínio e Regimento Interno) e de dinâmica democrática.

Uma comunidade que pode ser formada por pessoas de diferentes perfis, origens e níveis econômicos. Porém, os condôminos encontram a identidade e união no interesse em manter o empreendimento imobiliário em boas condições, para o pleno atendimento de sua finalidade (comercial, residencial, misto, etc.), bem como para preservação do valor de mercado da unidade autônoma.

Com o propósito de viabilizar a satisfação de tal necessidade é que o legislador relacionou como o primeiro e mais importante dever do condômino o de “contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção” (art. 1.336, I, do Código Civil).

Trata-se de um dever fundamental do condômino porque o condomínio edilício é uma entidade frágil e vulnerável, que na maioria dos casos depende exclusivamente do aporte que é feito mensalmente por cada um dos seus membros, por meio do pagamento da sua cota parte do rateio das despesas comuns.

E as sanções legais decorrentes da falta de pagamento não costumam causar grande temor aos inadimplentes, a saber, multa moratória (2%), juros moratórios (1% ao mês) e correção monetária, principalmente na atual conjuntura de grave crise econômica que o Brasil atravessa. Somem-se tais aspectos ao longo andamento que costumam ter as ações judiciais, que frustram a perspectiva de rápida recuperação dos valores devidos pelos inadimplentes.

Se diz que o condomínio é frágil, pois sequer é pessoa jurídica, sendo um “ente despersonalizado”. Ademais, diferentemente das empresas, o condomínio não visa e nem tem lucro, mas apenas divisão de despesas entre condôminos. Com efeito, como “o maná não cai do céu” para os condomínios, é de alta relevância que a inadimplência seja alvo de atenção, controle e correção. Do contrário, a falta de pagamento dos rateios será fonte de insatisfação entre os condôminos adimplentes, que serão forçados a cobrir os valores faltantes, até que o montante da inadimplência seja recuperado. Outra repercussão negativa da inadimplência é que, a depender da sua proporção, os serviços comuns são comprometidos por cortes orçamentários, cancelamento ou troca de contratos de prestação de serviços e de fornecedores, ocasionando maior precariedade na vida condominial.

Deste modo, muito mais que o temor de vir a sofrer as decorrências legais da inadimplência, deveriam os condôminos, sensibilizados pelo estilo de vida em comunidade, que requer maior solidariedade, boa-fé e cooperação entre todos os seus componentes, terem como prioridade o correto pagamento das suas contribuições condominiais, de forma a assegurar o bem-estar coletivo e individual.

Em artigos futuros voltarei a tratar de questões referentes ao controle da inadimplência, com sugestões amparadas na legislação, bem como outras que devem ser evitadas, posto que aventureiras.

Dr. João Paulo Rossi Paschoal: Advogado, mestre em direito pela PUC/SP, especialista em direito civil e direito Imobiliário, docente da UNISECOVI-SP e da UNINOVE, Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/SP e da Comissão de Direito Imobiliário da Subseção de Pinheiros da OAB/SP. joaopaulorp@gmail.com